sexta-feira, 1 de junho de 2012

5) Uma viagem a Los Angeles para visitar a Lockheed.

Em meados da década dos anos 50, a VARIG se animava a encomendar à fábrica Lockheed dois aviões Super-Constellation G que eram a última palavra em aeronaves de longo alcance. Na compra desses aviões havia sido obtido um financiamento do Eximbank americano, garantido pelo Banco do Brasil, que a VARIG teria que honrar nos anos seguintes, contando para isso com a renda que poderia produzir a nova linha para New York, a ser inaugurada quando os aviões fossem entregues, daí a um ano.

Tinha havido uma disputa entre a VARIG e a então Cruzeiro do Sul pela concessão dessa linha importante que era explorada exclusivamente pela PAA, porém a Cruzeiro se propusera a explorá-la com velhos aviões DC4 sobra de guerra, lentos e sem pressurização, ao passo que a VARIG o faria com os modernos Super G, rápidos, pressurizados, com cabine climatizada, instalações de toaletes e de cozinha. A empresa gaúcha ganhou a concessão e só faltavam duas coisas: os aviões e o treinamento de pilotos e mecânicos, o que era a minha área.

Iniciamos então em POA um intenso programa de treinamento para os futuros Connies e para uma das linhas aéreas mais importantes do mundo. Felizmente tínhamos um pessoal à altura. Um dos problemas que mais preocupava era o tráfego na área de New York, muito intenso e todo falado em inglês, com condições muito críticas no inverno rigoroso daquelas latitudes;

Tínhamos um instrutor em POA que era também controlador de tráfego aéreo, muito experiente e bom no inglês. Mandei-o a NYC entender-se com a chefia do controle de tráfego na área, e lá ele montou um programa de treinamento de vôo para o qual contratou um pequeno avião bimotor Piper, com o que nossas tripulações que iam em sequência a NYC, faziam operações de vôo simulando o que teriam que fazer com os Constellations nos futuros vôos com passageiros.

Finalmente nossos aviões ficaram prontos e nosso pessoal pode ir a Los Angeles para o treinamento nos aviões e para trazê-los para POA.

Na encomenda dos aviões, foi necessária a ida a Los Angeles de uma comitiva da VARIG para discutir com os americanos os detalhes de como seriam nossos aviões, já que havia várias opções e escolhas de equipamentos, decoração e acessórios. Assim, liderados por Berta, seguiram pela PAA alguns diretores (inclusive eu), acompanhados pelas respectivas esposas e duas filhas de Berta. A idéia era fazermos um pouco de turismo, o que todos desejavam.

Ficamos em Miami uns dois dias, e numa noite saímos, as mulheres, eu e o Diretor de Manutenção, um francês chamado Beaumel, que não falava inglês, para jantar num restaurante de comidas do mar, de excelente qualidade. Ao terminarmos o jantar, lá pelas duas da madrugada, saímos para a rua à procura de um taxi para voltar ao hotel, mas a rua tinha pouco tráfego e nenhum taxi à vista. Como na esquina passava uma avenida com bastante tráfego, disse a eles que ficassem ali defronte ao restaurante, que eu iria até a avenida tentar chamar um taxi que certamente passaria par lá. Houve acordo e assim foi feito. Alguns minutos mais tarde, eu já ausente do grupo, aproxima-se deles uma viatura da polícia. Beaumel, vendo a luz no teto da viatura, achou que seria um taxi e pôs-se no meio da rua agitando os braços. Os policiais pararam o carro e desceram, para saber que o havia com aquele grupo de mulheres acompanhadas por um homem que agitava os braços! Foi difícil explicar a situação aos policiais, em francês misturado com português, que eles não entendiam. O que salvou a situação foi a explicação que deu minha mulher, que tinha noções de inglês, e minha aproximação num taxi.

De Miami viajamos de avião até Chicago e de Chicago a Los Angeles num trem de luxo e muito conforto, o Santa Fé Super-Chief . Foram mais de trinta horas de viagem, quando pudemos contemplar, encantados, as belas paisagens daquela área das Rochosas. 

Em Los Angeles tínhamos hotel reservado pela Lockheed e no inicio da semana fomos à fábrica iniciar nosso trabalho. Eu tinha duas tarefas básicas: uma, traduzir para o português as dezenas de placas de informação aos passageiros, que existiam na cabine que eram todas escritas em inglês; a segunda tarefa, mais demorada, era elaborar com o pessoal da área de treinamento da fábrica um programa para a vinda de nosso pessoal que receberia treinamento nos aviões, tanto de vôo como de terra.

Fiquei encantado com os recursos de que dispunham os instrutores da Lockheed, Eles tinham painéis reproduzindo os diversos sistemas do avião, que eram animados eletricamente, e que ensinavam de modo perfeito o funcionamento e a operação de cada parte. Tinham também uns projetores chamados de “overhead” que projetavam transparências num quadro negro, podendo o instrutor ficar de frente para os alunos. Eu nunca vira tais maravilhas tecnológicas, e tratei de comprar exemplares de todo aquele material que não existia no Brasil, e que nos seria de grande utilidade quando começássemos a ministrar cursos de Super G em POA.

Ao fim da semana estava concluído nosso trabalho, e poderíamos retornar ao Brasil. No entanto, Berta queria conhecer alguns aspectos notáveis daquela parte dos USA, e assim programamos uma viagem de alguns dias, de automóvel, para o que alugamos dois Buick do último modelo, e partimos de LA com destino ao Grand Canyon do rio Colorado, eu guiando um dos carros e o Peixoto o outro.

Ah! Já ia esquecendo de algo de certo interesse: Durante nossa estadia em LA, Berta tinha manifestado interesse em que as mulheres (eram seis) fossem acompanhadas por uma cicerone que falasse português e que pudesse guiá-las nas compras e nos passeios. Creio que foi a Lockheed que contratou uma portuguesa de meia idade, açoriana, que se revelou extremamente ignorante e burra. Ela achava que nós os brasileiros éramos selvagens e que tudo na cidade (que ela mal conhecia!) era alta e maravilhosa novidade para nós. No primeiro dia de passeio, saí com algumas das mulheres e a portuguesa, guiando um carro que havíamos alugado. Antes da primeira esquina, a açoriana cutucou-me nas costas e disse num linguajar que quase não entendi: “Moço, ali na esquina tem umas luzinhas, uma verde e outra vermelha. Quando a vermelha estiver acesa, hai que parar; quando a verde acender, pode passaire ! “Claro que ela falou num português arrevesado, mas eu não sou capaz de reproduzi-lo agora. De qualquer modo, o caso é “sem comentários !”

Chegamos ao Grand Canyon, e nos deslumbramos com aquele espetáculo da natureza. Eu e Peixoto já o conhecíamos da viagem anterior em 1951, mas de qualquer forma foi muito gratificante olhar novamente toda aquela grandiosidade e poder mostrá-la aos amigos.
Ficamos cerca de 24 horas por ali, nos hospedamos num hotel à beira do Canyon atendido por índios muito bem vestidos e treinados, e afinal partimos para o estado de Nevada, onde ficamos dois dias num suntuoso hotel junto a um cassino em Las Vegas, onde havia daquelas máquinas de jogo “caça-niqueis” até do banheiro do apartamento, ao lado da latrina. A idéia era que o vivente jogasse na máquina enquanto evacuava!

Afinal voltamos a Los Angeles onde embarcamos num DC6B da Compañia Mexicana de Aviacion, uma subsidiária da PAA, com destino à capital do México onde ficaríamos dois ou três dias fazendo turismo. Houve um incidente no aeroporto, quando a Afândega mexicana prendeu nossas malas não deixando que as levássemos para o hotel, não sei por que razão. Irritei-me com a atitude dos funcionários, passei por cima do balcão, peguei as malas uma por uma e fomos para o hotel sem mais problemas.

Voltamos afinal ao Brasil pela PAA, muito satisfeitos com a experiência que tivéramos, e ficamos em POA preparando a empresa para o grande salto que a esperava com a nova linha para New York, e aguardando a chegada de nossos novos aviões daí a algum tempo.

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