terça-feira, 5 de junho de 2012

16) Um aviador na cadeia

O “Eletrinha”

Nos tempos de meus primeiros vôos pela fronteira, com os aviões Junkers F-13, eu exercia as funções de co-piloto. mecânico e rádio-operador. Havíamos, eu e outros, feito um curso de operador de rádio-telegrafista, aprendendo a transmitir e receber em código Morse, e prestando exame nos Correios e Telégrafos para obter o certificado que nos liberava para voar como rádio-operadores. Nesses vôos eu fazia quase tudo, inclusive abastecer o avião e carregar a bagagem dos passageiros, menos decolar e pousar o avião. Para isso havia o Comandante, sentado à esquerda no Cock-pit; A VARIG tinha por essa época, não mais do que cinco Comandantes, e eu voava com todos eles, conforme a escala de vôos que era feita semanalmente em Operações, menos um. Esse, já madurão e um dos antigões, tinha um desempenho péssimo. Pilotava tão mal, que eu cheguei a ter o atrevimento (pois era um garoto insignificante aos olhos dos chefes), de pedir que não me escalassem mais com o tal piloto, pois eu temia um acidente, de tão mal que ele voava.

Antes disso, porem, fiz um vôo com ele no qual pernoitamos num mísero hotel em Santana do Livramento.  Nós dormíamos os dois no mesmo quarto, por economia que a RG fazia. À noite, depois de cumpridas todas as tarefas no aeroporto, cansado, jantei, deitei e dormi.

Pela manhã, quando chegou o agente da VARIG para levar-nos ao aeroporto, pois devíamos seguir para Bagé e Pelotas, verificou-se que o tal Comandante não dormira no quarto, pois sua cama estava como na véspera.

Como o Comandante em questão era sabidamente freqüentador de cabarés (e os que existiam na época nessas cidades do interior, eram da mais baixa categoria!), o agente foi a alguns deles e terminou descobrindo que nosso Comandante envolvera-se numa briga, provavelmente embriagado, e que fora preso na cadeia local. Pois foi preciso muito jogo de cintura para conseguir liberar o homem da prisão e levá-lo  afinal ao aeroporto, para executar o vôo, certamente em péssimas condições físicas. Não houve acidente porque não tinha chegado a hora...

Coisas desse tipo aconteciam na empresa primitiva, sem que as autoridades responsáveis tomassem ou conhecimento, ou providências!

Esse piloto, alguns anos mais tarde, quando a VARIG comprou da Panair dois aviões Lockheed Electra 10E, morreu num grave acidente no rio Guaíba, em POA. Nós voávamos na RG exclusivamente por contato visual com o terreno, a muito baixa altura do solo, navegando baseados em pontos de referência conhecidos, como matos de eucalipto, rios, estradas, ferrovias, etc. Com a chegada dos “Eletrinhas” como os chamávamos, que eram aviões relativamente modernos, com instrumental que permitia o chamado “vôo cego”, nós os pilotos, passamos a aprender a voar por instrumentos e usando a rádio-goniometria para orientação. Voávamos não mais rente ao solo, mas em altitudes pré-estabelecidas em nossos planos de vôo, não havendo mais a preocupação de enxergar o solo.

O piloto ao qual me referi acima, porem, continuando com suas velhas tradições de vôo visual, veio de Pelotas para POA naquelas antigas condições. Ao chegar sobre o rio Guaíba, nas imediações do destino, encontrou condições de tempo muito difíceis, com núvem CB e teto baixo sobre o rio. Tentou então passar por baixo daquilo tudo mas chocou-se com a superfície do rio, mergulhando com alta velocidade. Todos a bordo morreram, infelizmente. O resto do pessoal mais novo que voava os Electra, voava direitinho por instrumentos, sem problemas.

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