sexta-feira, 22 de junho de 2012

45) A revoada dos uruguaios


Como já disse, há tempos faziam-se festas aeronáuticas, principalmente em outubro durante a Semana da Asa. Havia demonstração de vôos acrobáticos, concursos, revoadas. Hoje parece que não se usa mais fazer dessas coisas! Será que a aviação se tornou tão comum e corriqueira que não vale mais a pena festejá-la? Não saberia dizer.

Pois um dia desses tempos, a VARIG, que voava para Montevidéo há já algum tempo, talvez por razões publicitárias, promoveu uma revoada de aviões uruguaios de turismo ou esporte, de vários pontos daquele país a Porto Alegre. Os aviadores seriam recebidos pela VARIG (o próprio Ruben Berta estava envolvido) no aeroporto São João, levados para hotéis, depois fariam uma excursão a Caxias voltando no mesmo dia à tarde, iriam novamente para hotéis e talvez no dia seguinte decolariam de volta a seu país. Tudo pago e monitorado pela VARIG, através de meu setor, que era o mais relacionado com essas coisas esportivas.

Fiz um contato com a administração do aeroporto e consegui que destinassem uma grande área entre a pista de pouso e as instalações da RG, terreno gramado, para o estacionamento dos 40 ou 50 aviões pequenos dos uruguaios. Preparei estacas e cordas para amarrarmos as avionetas, pois a época era de vendavais. Depois fiz algo que aprendera quando fora a Natal, RN (Base Aérea de Parnamirim, na mão dos norte-americanos), buscar peças para nossos C-47: Eles tinham um jeep com uma grande tabuleta na traseira, na qual estava escrito com letras grandes: “FOLLOW ME”. Quando a gente pousava na pista da Base, esse jeep vinha ao nosso encontro e se postava à frente do avião, de forma a que o piloto sabia que devia segui-lo até o estacionamento. Assim, pois, coloquei numa nossa viatura uma tabuleta que dizia, em letras garrafais: “SIGA-ME”.

O uruguaios começaram a chegar e a pousar no aeroporto. Eu ou outro qualquer seguíamos até o avião recém pousado e o conduzíamos ao local escolhido para o estacionamento, sempre usando a tal tabuleta SIGA-ME, o que deu excelentes resultados. Quando os aviões eram estacionados minha turma de mecânicos e auxiliares cravava estacas no solo e amarrava os aviões o mais firmemente possível. Assim foi feito com todos, e seus pilotos e eventuais passageiros foram reunidos, colocados num ônibus e levados a Caxias para uma visita e almoço. Ruben Berta seguiu no mesmo ônibus, à testa da comitiva.

Tudo pronto, deixei alguns elementos como guardas dos aviões e fui para casa almoçar. Em cerca de uma hora, notei que o tempo estava mudando, com aspectos tormentosos e, preocupado com os aviões dos uruguaios, segui de volta ao aeroporto, acompanhado de minha esposa. Quando lá chegamos, vi que o quadrante oeste do céu estava prenunciando mau tempo. Convoquei minha turma e revisei todas as amarras dos aviões. Depois coloquei meu carro à frente dos aviões mais avançados, e aguardei os acontecimentos, temendo pelo que pudesse acontecer. Pois não deu outra: aproximou-se um tremendo temporal, com chuva e ventos fortíssimos, a ponto de eu quase não poder respirar, na rua, tanto era o volume de água que caía dos céus. Com o forte vento, os aviões mais à frente começaram a levantar vôo, arrancando as estacas que havíamos cravado no solo, ou arrebentando as cordas que os amarravam, e depois caindo sobre os que estavam mais atrás, num pandemônio de destruição. Isso tudo durou talvez uma meia hora, ao cabo da qual, afastado o temporal, pudemos verificar que todos os avião haviam sido danificados, uns mais outros menos!

Fiquei desolado e extremamente preocupado com o que teríamos que fazer. A caravana de uruguaios com Ruben Berta deveria já estar a caminho de POA, por isso entrei em meu carro e segui pela estrada BR‑116 ao encontro do ônibus que deveria voltar de Caxias. Encontrei-o além de Novo Hamburgo, fiz sinal para que parasse e aproximei-me da porta aberta. Todos olharam-me com preocupação, pois certamente eu estava trazendo más notícias. Ruben Berta sentava-se na primeira poltrona do ônibus e foi a ele que eu me dirigi, contando o que acontecera.

A consternação foi generalizada, como se pode deduzir. Houve lágrimas e lamentações. Berta, porem, foi à altura da tragédia: Tratou de tranqüilizar os uruguaios, assegurando a eles que a VARIG reconstruiria todos os aviões , que eles retornariam a Montevidéo nos aviões da VARIG de graça, e que, à medida em que os aviões ficassem prontos eles seriam avisados via RG de Montevidéo para que viesse buscá-los, sempre sem despesas.

Isso serviu de consolo, e aos poucos os “hermanos” foram se acalmando, para serem levados a hotéis, sempre às expensas da RG. Fizemos uma lista de todos, com seus endereços e telefones, e pusemos mãos à obra. Em cerca de um ano as oficinas da antiga VAE e agora pertencentes à Dir. do Ensino, reconstruíram todos os aviões. O uruguaios, muito satisfeitos, chegavam a POA e recebiam seus “novos” aviões, levando-os de volta ao lar. Essa generosidade da VARIG rendeu bons dividendos, pois tudo o que aconteceu foi amplamente divulgado pela imprensa uruguaia, ficando o conceito da empresa gaúcha, no país vizinho, nas alturas.

Um comentário:

  1. Cmte. Rubens, primeiro muito obrigado por este blog, valor inestimavel e prazer de leitura imensa. Leio todos os dias !!!

    Que historia interessante, grandes homens como o sr e Rubens Berta são idolos para nós, lendo estas historias minha admiração só aumenta.

    Um grande abraço !

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