segunda-feira, 23 de julho de 2012

61) Acidentes com aviões e sua investigação

Quando ocorre um acidente aviatório, com ou sem vítimas a lamentar, existe sempre a preocupação de investigar o que ocorreu, quais as causas do acidente e, em função disso, adotar ou recomendar providências que visem evitar outro acidente nas mesmas condições ou condições semelhantes. A investigação de um acidente, no entanto, pode ser às vezes muito difícil, requerendo sua solução a presença de investigadores competentes e experientes, que disponham de ilimitados recursos técnicos e laboratoriais. É tal a importância de uma investigação de acidentes com avião, que governos tais como o dos USA há muito tempo criaram organismos altamente especializados nessa tarefa. Nos USA existe há muito tempo a então CAB (Civil Aeronautics Board), que era especializada na investigação de acidentes com aviões e hoje foi estendida à investigação de acidentes com quaisquer meios de transporte.(NTSB, National Transportation Safety Board).
Na VARIG, durante alguns anos os eventuais acidentes com aviões ou não eram investigados, ou eram analisados muito sumaria e improvisadamente. Em geral saía todo mundo correndo para apanhar o primeiro transporte que fosse ao local do acidente, sem que pessoas pré-escolhidas e preparadas, equipadas com material adequado ao caso, fossem as que acorriam ao local e davam início à investigação. A autoridade aeronáutica do pais, também, geralmente destacava um oficial qualquer que se dirigia ao local e não tinha, às vezes a devida qualificação para a investigação, louvando-se eventualmente nas conclusões a que porventura o pessoal da empresa tivesse chegado. Nas demais empresas do Brasil, a situação era aproximadamente a mesma.
Houve alguns acidentes com aviões da VARIG e de outras empresas, mas em geral as eventuais conclusões não eram eficientemente utilizadas como advertências e precauções contra outros acidentes que pudessem acontecer de forma semelhante. Isso porque não havia uma organização adequada a essas medidas. Cite-se como exemplo um acidente na decolagem do Galeão com um DC-8 da PANAIR. O avião teve pane de motor após a V1 e o piloto que estava nos controles decidiu interromper a decolagem quando não havia mais pista para tal. O avião caiu no mar e houve vítimas fatais por falta absoluta de uma embarcação que pudesse resgatar os passageiros acumulados sobre as asa da aeronave, que flutuou por uns 20 minutos. Eu casualmente estava no aeroporto e vi tudo acontecer. Soube-se do acontecido porque os pilotos nadaram para a terra e sobreviveram. Algumas horas após o acidente, eu já estava em meu hotel, pronto para dormir, quando bateram na porta do quarto lá pelas 2 da madrugada. Eram Ruben Berta e o Brigadeiro Diretor do DAC que queriam minha opinião sobre o acontecido. Tive oportunidade de dizer que uma coisa a ser feita era manter embarcações de prontidão nas cabeceiras das pistas que terminavam no mar, para evitar que pessoas morressem afogadas. Que eu saiba, até hoje isso não foi feito.
Não quero dizer que inventei a investigação científica de acidentes aeronáuticos em nosso pais, mas de algum modo, pelo menos um pouquinho, eu contribui para a melhoria das investigações. Isso se explica: No ano de 1951, eu e o amigo e colega do Erni Peixoto. Como já disse antes, fomos aos USA, numa bolsa de estudos patrocinada pela CAB americana, órgão que cuidava das relações internacionais da aviação civil americana e da investigação de acidentes com aviões dos USA, para a qual viajamos por todo o território norte-americano, visitando organizações relacionadas com o tráfego aéreo civil, e estagiando alguns dias aqui ou ali. Nessa ocasião tivemos oportunidade de visitar a sede da CAB em Oklahoma City, onde fiquei vivamente interessado no aspecto de investigação de acidentes, para o que essa Junta dispunha de todos os recursos imagináveis e de investigadores profissionais experientes e categorizados. Aprendi muita coisa com eles nessa área, e inclusive pude ver como tratavam das conclusões e recomendações após um acidente. Entre outras coisas eles publicavam um relatório extenso, minucioso e muito instrutivo, que era distribuído entre todas as empresas de tráfego aéreo, inclusive do exterior. Tratei nessa ocasião de inscrever-me em sua “mailing list” para receber também tais relatórios, o que aconteceu durante vários anos. Eu recebia os relatórios na Dir. do Ensino em POA, traduzia-os (às vezes fazendo um resumo), imprimia-os na gráfica do Ensino e os distribuía entre todos os que pudessem ter interesse em seus ensinamentos, inclusive empresas rivais tais como Real, Cruzeiro, etc.
O que aprendia com esses relatórios, acrescido do que observara em minha visita à CAB nos USA, serviu como base a uma tentativa de organizar na VARIG em POA um arremedo de Comissão Investigadora de Acidentes, o que funcionou satisfatoriamente durante o tempo em que estive em POA, antes da compra da REAL. A primeira coisa que fiz, foi organizar “kits” de equipamentos que poderiam ser úteis em caso de acidente. Isso porque, antes disso, os improvisados investigadores saiam ventando de POA com a primeira condução até o local do acidente, sem levar qualquer equipamento que poderia ser útil ou até necessário à investigação. Assim, com o auxílio de colegas (inclusive o competente e saudoso Dr. Oscar Petersen), montei bolsas de lonas com coisas tais como ferramentas, alguns medicamentos de urgência, lanternas, salva vidas, facões, botas, soro anti-ofídico e tetânico, embalagens para armazenar amostras, papel e canetas para anotações, e outras coisas mais. As bolsas eram separadas de acordo com o local do acidente: ou mar, ou selva, ou montanhas, regiões frias ou quentes, roupagens especiais, etc.
Em seguida organizei uma pequena comissão investigadora, com pessoal escolhido e sob minha orientação. Tivemos oportunidade de investigar um ou outro acidente, de maiores ou menores proporções, com bons resultados. Após cada investigação, eu elaborava um relatório completo e minucioso, o qual, assinado por mim, era impresso e distribuído em caráter sigiloso, aos elementos que pudessem estar interessados no assunto. Era inevitável apontar um ou outro culpado de falhas ou erros que tivessem levado ao acidente, e infelizmente isso fazia com que alguns elementos pouco confiáveis entregassem cópias dos relatórios sigilosos a parentes dos eventuais acusados, que então vinham a mim reclamar do que chamavam de “acusação injusta contra um ente querido”, o qual às vezes tinha falecido no acidente, apesar de eventual responsabilidade. Essa foi uma de minhas ocupações enquanto estive na Diretoria do Ensino, em POA. Alguns anos mais tarde fui transferido para o RIO e depois SAO, e não mais me envolvi com a investigação de acidentes. Felizmente hoje em dia existe um organismo oficial responsável pela investigação de acidentes de aviação, a CENIPA, ficando as empresas até certo ponto, liberadas dessa responsabilidade.

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