Rubens A R Bordini – março, 2014
O
ser humano é essencialmente irrequieto! Ele precisa se movimentar de um lado para
o outro, mas onde? Ora, no lugar onde vive, ou seja, na superfície deste nosso
planeta. Essa superfície presta-se naturalmente à nossa locomoção, ou em terra
firme ou sobre água, o que o homem aprendeu há muito tempo. Havia, porem um
outro meio que se prestava à locomoção e que restava ser conquistado: A
atmosfera. E muitos e muitos e muitos milênios depois que o homem começou a
caminhar ereto, o meio aéreo foi afinal usado para a locomoção; surgiram as
máquinas voadoras, que agora andam por aí aos milhares.
A
penetração de uma dessas máquinas na atmosfera apresentava alguns problemas,
sendo um deles a orientação. Era preciso saber para onde se ia, sob o risco de
perder-se. No começo os aviões só tinham dois instrumentos de navegação ou
orientação no ar: A antiga bússola magnética, supostamente inventada pelos
chineses há milênios, e o olho do aviador ou navegador. Era preciso enxergar o
solo e identificar pontos de referência para orientar-se satisfatoriamente.
Talvez alguém ainda se lembre do tempo em que a gente fazia um voo rasante
sobre uma estação ferroviária, para ler no telhado da mesma o nome da
localidade, que alguém, generosa e prudentemente, pintara em letras garrafais.
Era uma confirmação indiscutível que a gente estava, ou na rota, ou perdido!
Outro
exemplo de navegação aero-ferrodrômica: Quando a VARIG começou a voar para
Montevideo, havia uma linha ferroviária ligando Rio Branco (fronteira com
Jaguarão, no RS) à capital uruguaia. Com mau tempo, a gente voava rasante sobre
a linha do trem, chegando a Montevideo razoavelmente bem orientado. Acontece
que a FAB (Força Aérea Brasileira) também voava para Montevideo e usava a
mesma linha férrea como instrumento de orientação. Havia portanto o perigo de
colisão entre os aviões da FAB e da VARIG, nos dias de má visibilidade. Foi
preciso então haver um acerto entre VARIG e FAB para que os respectivos pilotos
voassem sempre com os trilhos do trem à sua esquerda, evitando assim o risco da
colisão!
Essa
época, porem, da heroica navegação visual, passou, ou foi atenuada, quando
surgiu o rádio. Na verdade, uma complementava a outra, como era o caso, por
exemplo, de Curitiba, quando começamos a voar para lá depois de recebermos os
Lockheed “Eletrinha”: Havia lá um aeródromo antigo, Bacacheri, militar, que
possuía um rádio-farol, e um novo aeroporto, Afonso Pena, onde deveríamos
pousar, mas que ainda não tinha rádio-farol. Então, com mau tempo,
sobrevoávamos Bacacheri voando por instrumentos e apoiados no farol local,
descíamos até contato visual precário com o solo, e então, visualmente,
seguíamos em voo rasante sobre uma linha telefônica que ia de Bacacheri a
Afonso Pena. Era, pois, uma navegação mista, rádio-visual, muito precária.
O
rádio (goniometria, VOR, etc.) foi e creio que ainda é muito usado,
principalmente para aproximações por instrumentos em aeroportos onde não existe
coisa melhor. Para voos de longa distância, a partir dos anos 1950, surgiram
equipamentos cada vez melhores, uns tornando os anteriores obsoletos. Houve o
LORAN (Long Range Navigation), seu similar aperfeiçoado, que dependia de
algumas estações em terra, depois algo que parecia a solução final: o Sistema
Inercial, baseado em giroscópios, e que não dependia de qualquer apoio de
terra; era auto-suficiente a bordo. Então chegaram os satélites que em grande
quantidade abraçam hoje nosso planeta. O GPS é hoje em dia uma realidade que,
aparentemente, neutraliza tudo que até pouco tempo existia e era considerado
perfeito.
E
não vamos esquecer a navegação astronômica, herdade da marítima, que foi usada
em voos de longa distância, antes do advento dos processos mais sofisticados. Alguns
aviões tinham, nessa época, uma cúpula de plexiglas, através da qual o
navegador visava corpos celestes pré-escolhidos, para determinar a posição do
avião em sua rota. Quando surgiram as cabines pressurizadas, no entanto, essas
coberturas foram eliminadas porque, segundo consta, um navegador teria sido
sugado para o exterior, quando a tal cúpula não resistiu à pressão da cabine.
Apareceram então os sextantes periscópicos, mas que foram de curta duração. A
VARIG tinha um radio-operador (telegrafista) a bordo de seus aviões, na época
em que as comunicações em fonia eram deficientes. Com a chegada dos aviões
Super-Constellation, equipados com excelente equipamento de rádio, foi possível
dispensar o radio-operador, pois os próprios pilotos comunicavam-se em fonia.
Como estávamos precisando de navegadores para a rota Rio-New York, demos
treinamento de navegação aos telegrafistas, que passaram a ser “Navros” (Navegadores-Radio
Operadores.)
Na
nova rota para New York, com os aviões Super-Constellation, voava-se entre Rio
e Belém durante várias horas, sobre uma densa e selvagem selva amazônica, pois
ainda não existia Brasília e esse interior do país não estava desenvolvido. Voava-se,
portanto, sem qualquer auxílio rádio, dependendo somente de duas coisas: a
navegação celestial quando havia visibilidade, e o uso do radar meteorológico
que o avião tinha na proa, e cuja antena podia ser inclinada para baixo de
forma a apresentar uma visão razoável do solo à frente do avião. Os rios que
atravessavam a selva tornavam-se visíveis na tela do radar e isso fornecia um
tipo de navegação visual algo precário, porem melhor do que nada.
E
a vetusta, e quase que completamente imutável através dos tempos, bússola
magnética, que tanto serviu aos navegadores e foi conhecida e utilizada por
todas as gerações de aviadores deste planeta, desde Santos-Dumont, até sei lá
que tempo? Será que ela ainda é usada? Será que ainda tem seu lugar reservado
no painel de instrumentos dos modernos aviões?
Eu
fui um aeronauta e aeroviário por várias décadas, mas hoje, com meus noventa e
tantos anos de idade, os aviões estão muito distantes de meu conhecimento, e o
pouco que sei sobre os mesmos é proveniente de leituras e notícias de rádio e
televisão. A única coisa que eu piloto hoje em dia é uma cadeira de rodas! Eu
não saberia, portanto, dizer se a velha bússola, minha companheira de vários e
inesquecíveis anos de voo, ainda está presente nos painéis. Talvez algum dia
alguém atualizado nesses assuntos, possa me contar se ela ainda existe ou não! Afinal
ela funciona impulsionada por algo que não nos custa nada, o campo magnético da
Mãe Terra. Faço votos para que a bússola ainda apareça nos painéis dos aviões
modernos, nem que seja por tradição ou homenagem a seus bons e antigos
serviços.
E
aqui terminamos, por enquanto! Até a próxima!
Comandante,
ResponderExcluirTODOS os aviões são OBRIGADOS a ter uma CABRAL ( como chamamos a boa e velha bússola magnética ). Não posso lhe garantir mas creio que até a SPACE SHUTTLE possuía uma. Não sei se essa meninada do joystick sabe usar uma Cabral mas as máquinas deles tem sim. Precisa de um certo conhecimento e técnica para usá-la corretamente em movimento, tem um retardo e ela gira ao contrário do movimento, precisa pensar antes de fazer a curva, diferente do HSI.
Schumann
O Space Shuttle poderia ter para quando estivesse na parte final da operação de pouso, porque quando estivesse em órbita não serviria para nada uma Cabral.
ResponderExcluirPaz, Saúde e Prosperidade
Schumann
Sim, ainda possuem!! Todos... desde os experimentais até o A380!!
ResponderExcluirSim, é obrigatório a sua instalação, e independente de todos os sistemas da aeronave, incluindo o elétrico, de forma a ser confiável em caso de falha de todos os demais sistemas, redundantes ou não...
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